MARCAS DE EXPRESSÃO

- Por Maurício Santini - Eu, tirar minhas marcas de expressão? Qual o por quê de extraí-las, se foram elas que me deram expressão? Limpar da minha vida as tristezas que fizeram traços na minha testa. Não. Prefiro aprender com a minha fronte.
Varrer do canto dos olhos os sorrisos que eu dei, as alegrias que eu tive? É uma forma estúpida de estética, como se eu fosse alisar minhas experiências, as que eu vivi com muito custo e honra, apesar de algumas dores. Esticar minha cara contra a natureza? Embonecar-me como um brinquedo em série? Nada disso traz a verdade. Se daqui a pouco a minha papada estiver mole é porque cantei muito, falei do meu amor pelos quatro cantos do mundo e por todos os cantos da boca. E se há cabelos brancos, é eu comecei a acender melhor minhas idéias. Se hoje eu não corro e me canso com mais facilidade, é porque tenho a vivência de saber que muitos passos que damos são dados em falso, trôpegos até. Quantas vezes eu escorreguei pelas ciladas do destino? Quantos buracos, quantos caminhos errantes, quantas bifurcações... Minhas pernas seguem mais lentas, todavia precavidas dos acidentes de percurso. Quando vejo uma pedra, não mais a chuto, deixo que ela fique em seu lugar. Meus braços não querem tantos músculos definidos e, sim, a definição de um abraço afetuoso. Agora solto mais minha barriga. Já quase não tenho mais medo. Já não reteso tanto minhas emoções e nem as guardo no armário embutido do abdômen. A barriga era mais dura, eu era mais duro e a vida, para mim, era mais dura. Sentia com o estômago. Apaixonava-me com o fígado, sofria muito pelo intestino. Para que uma barriga de tanquinho e um ralo de esgotos na cabeça? Não posso dizer que nunca mais tive emoções tão indigestas. A diferença é que o alimento que vem dos outros me faz menos mal e a minha digestão é mais segura e confiante. Apenas ando, caminho com as árvores, abraço-as, dou nome a elas. Olho para o céu, hoje, olho para o céu e procuro as estrelas mais próximas, busco as distantes, apesar de não enxergá-las com os olhos. Com meus pés piso a terra - seca ou molhada, tanto faz -, e sinto sua pele. Parece incrível sentir o coração do Planeta com os pés. As flores são vistas, outrora desprezadas. As plantas dormem ao meu lado. Falo com os bichos e escuto suas frases. Antes minha surdez era mais jovem. Posso dizer que, agora, minha voz, mais grave e mais fraca, é capaz de dizer que ama com muito mais firmeza e verdade. E, como ela já disse: não sou eu quem faz os anos, os anos é que me fazem. São Paulo, 14 de setembro de 2007.

Nota de Wagner Borges: Mauricio Santini é jornalista, escritor, poeta e espiritualista. É meu amigo há muitos anos, e sempre me emociono com os seus textos brilhantes e cheios daquele algo a mais que só os grandes escritores e poetas possuem. Para ver outros textos dele, é só entrar em sua coluna na revista on line de nosso site - www.ippb.org.br.

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